
A força da pecuária brasileira não está apenas no volume de produção ou na qualidade da carne. Cada vez mais, ganha destaque a capacidade do produtor rural brasileiro de produzir com responsabilidade socioambiental. Em um cenário de abertura de mercados mais exigentes, seguir as normas ambientais, sociais e produtivas vem se mostrando como uma estratégia para acessar novas oportunidades de agregação de valor.
Ao mesmo tempo, a complexidade dessas regulamentações impõe um desafio diário aos pecuaristas. São leis, decretos, instruções normativas, normas regulamentares, etc., que exigem atenção permanente, planejamento e gestão eficiente.
Segundo Paulo Costa, Head de Pecuária da Produzindo Certo, essa é uma dificuldade comum no campo. “São tantas legislações e normas que precisam ser observadas pelo produtor que, mesmo com esforço para manter toda documentação em dia, algum item pode acabar passando despercebido ou nem mesmo ser do conhecimento do produtor que houve a publicação ou atualização de alguma regulamentação específica”, explica.
Diante desse cenário, iniciativas de apoio técnico e estratégico têm se mostrado fundamentais para o produtor rural. Nesse sentido a Produzindo Certo desenvolveu o Protocolo Produzindo Certo (PPC), ferramenta que avalia criteriosamente os regulamentos relativos a aspectos ambientais, sociais e produtivos de uma propriedade rural.
Com base na legislação vigente, é avaliada a conformidade da propriedade e, a partir dos itens analisados, é gerado um score de 0 a 100 que indica o grau de conformidade da fazenda. “Ao final, é elaborado um plano de ação sob medida, oferecendo a oportunidade de implementar as adequações necessárias na propriedade”, destaca Paulo.
Essa avaliação permite que o produtor visualize de forma objetiva o que precisa ser ajustado para atender às exigências legais e avançar rumo a práticas mais sustentáveis e competitivas.
Projeto Valorizar para Transformar no Pará
Uma das iniciativas de apoio aos pecuaristas é o projeto Valorizar para Transformar, desenvolvido no estado do Pará desde 2024. A ação já atendeu 175 propriedades rurais, oferecendo consultoria técnica gratuita, diagnóstico socioambiental detalhado e plano de ação para implementação de melhorias.
“O objetivo é alcançar 300 propriedades até dezembro de 2026. Ainda há vagas disponíveis para produtores que tiverem interesse em avaliar suas propriedades”, explica o Head de Pecuária.
Além de fortalecer a imagem da pecuária local, o projeto contribui para que os produtores avancem em direção a mercados mais exigentes e programas de incentivo ligados à sustentabilidade.

Riscos de não cumprir a legislação
Assim como aspectos socioambientais podem se tornar diferenciais de mercado, não seguir as normas ambientais, sociais e produtivas pode trazer consequências sérias. Entre elas, multas, embargos de áreas produtivas, processos trabalhistas e até ações judiciais.
Para evitar essas situações, a adequação deve ser vista como investimento e não como obstáculo. A conformidade legal garante segurança jurídica, estabilidade financeira e reforça a imagem positiva da pecuária brasileira no mercado interno e internacional.
“A conformidade socioambiental vem sendo cada vez mais cobrada pelos mercados importadores, seja em negociações para abertura de novos mercados, seja por meio da atuação das redes varejistas e dos grupos frigoríficos”, reforça Paulo.
O primeiro passo
Muitos produtores acreditam que adequar uma propriedade inteira de uma vez é inviável, mas Paulo explica que a estratégia pode ser gradual e inteligente. “Sempre orientamos ao produtor a iniciar com o que está mais fácil de adequar à legislação. A escolha é na maioria das vezes iniciar pelas adequações que têm menos custo”, afirma.
Com planejamento e apoio técnico, é possível avançar de forma consistente, reduzindo riscos e fortalecendo a posição da fazenda no mercado.
A conformidade socioambiental é mais do que uma exigência: é uma ferramenta de proteção e crescimento. Com o apoio de ferramentas como o Protocolo Produzindo Certo e de iniciativas como o Valorizar para Transformar, os pecuaristas têm acesso a suporte técnico e estratégico para enfrentar os desafios da legislação e transformar os desafios regulatórios em oportunidades.

Principais regulamentações que impactam a pecuária de corte no Brasil e verificadas pelo Protocolo Produzindo Certo:
- Código Florestal Brasileiro – Lei n° 12.651 de 25 de maio de 2012
- Decreto Federal – nº 7.830, de 17 de outubro de 2012. Regulamenta o CAR previsto no Código Florestal, dispõe sobre o Sistema de Cadastro Ambiental Rural – SICAR, o Cadastro Ambiental Rural – CAR, e estabelece normas de caráter geral aos Programas de Regularização Ambiental – PRA
- Licenciamento ambiental – Resolução CONAMA nº 237, de 19 de dezembro de 1997. Dispõe sobre a revisão e complementação dos procedimentos e critérios utilizados para o licenciamento ambiental.
- Lei de crimes ambientais – Lei Federal de nº9.605, de 12 de fevereiro de 1998. Essa norma define as infrações e punições para pessoas físicas e jurídicas que causem danos ao meio ambiente. Ela é uma das principais leis ambientais do Brasil, consolidando em um único texto as sanções penais e administrativas aplicáveis a condutas lesivas ao meio ambiente.
- Decreto Federal – Decreto federal nº 6.514, de 22 de julho de 2008. Define o que é considerado infração ambiental e quais penalidades podem ser aplicadas pelos órgãos de fiscalização.
- Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) – Lei Federal nº 12.305, de 02 de agosto de 2010. Estabelece diretrizes para a gestão integrada e o gerenciamento ambientalmente adequado dos resíduos sólidos, envolvendo poder público, setor empresarial e sociedade.
- Dispõe sobre o trabalho rural e dá outras providências – Lei nº5.889, de 08 de junho de 1973. Regulamenta as relações de trabalho no meio rural no Brasil. Ela complementa a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), adaptando seus dispositivos à realidade das atividades agrícolas, pecuárias, extrativas e agroindustriais.
- Instrução Normativa nº 56, de 6 de novembro de 2008. Essa Instrução Normativa estabelece diretrizes para garantir o bem-estar de animais criados com fins produtivos ou econômicos no Brasil. Ela orienta sobre práticas adequadas de manejo, transporte e instalações, visando minimizar o sofrimento e promover o cuidado ético com os animais.
- Instrução Normativa nº 10, de 03 de março de 2017. Estabelece o Regulamento Técnico do Programa Nacional de Controle e Erradicação da Brucelose e da Tuberculose Animal (PNCEBT), com o objetivo de reduzir a prevalência dessas doenças no rebanho nacional e garantir a segurança sanitária da produção agropecuária brasileira.)
- Instrução Normativa nº 11, de 8 de junho de 2005. Regulamento Técnico para Registro e Fiscalização de Estabelecimentos que Manipulam Produtos de Uso Veterinário. Ela visa assegurar que a manipulação desses produtos seja realizada de acordo com boas práticas de fabricação, garantindo a segurança e eficácia dos medicamentos veterinários.
- Instrução normativa nº 11, de 8 de junho de 2005. Trata de produtos de uso veterinário, estabelecendo normas para registro e fiscalização de estabelecimentos que manipulam esses produtos.
- Legislação Estadual do Pará – Decreto Estadual nº 838/2013 e Decreto n° 941 de 4 de agosto de 2020 (Plano Estadual Amazônia Agora – PEAA)
Pontos de atenção para o produtor
Ambiental – Os produtores devem estar atentos ao licenciamento das atividades desenvolvidas na propriedade, garantindo que todas estejam devidamente licenciadas. Exemplos incluem:
- Licenciamento para criação de animais (pecuária), conforme legislação ambiental vigente;
- Licenciamento para atividade de confinamento, necessário por conta do manejo de dejetos animais;
- Licenciamento para uso de água (captação em rios, córregos ou poços);
- Licenciamento para tanque de combustível, comum nas propriedades para abastecer a frota interna de veículos;
- Gestão de resíduos sólidos e líquidos, conforme a Lei nº 12.305/2010 (Política Nacional de Resíduos Sólidos);
- Cumprimento das exigências da Lei nº 9.605/1998 e do Decreto nº 6.514/2008 quanto a sanções ambientais;
- Atenção às áreas de desmatamento: Identificar se houve desmatamento pós-Código Florestal de 2012 ou antes da data de corte de 22 de julho de 2008, mantendo registros e documentação de conformidade;
- Riscos de embargo: Propriedades com desmatamento irregular ou sem a documentação exigida podem sofrer embargos em áreas de produção, prejudicando a atividade e comercialização dos produtos.
Social – Os produtores devem garantir que os direitos dos trabalhadores sejam respeitados e evitar passivos trabalhistas:
- Registro formal de funcionários, conforme a Lei nº 5.889/1973 (trabalho rural) e a CLT (Decreto-Lei nº 5.452/1943), incluindo contratos, salários e jornada de trabalho.
- Igualdade salarial e condições de trabalho, garantindo que homens e mulheres na mesma função recebam remuneração equivalente.
- Infraestrutura para trabalhadores, em conformidade com a NR-31, garantindo alojamentos, refeitórios, vestiários e saneamento básico adequado.
- Segurança no trabalho, seguindo as normas de saúde ocupacional, incluindo EPIs, prevenção de acidentes e treinamento adequado.
- Apoio contábil e jurídico, para organização de folhas de pagamento, contratos, benefícios e cumprimento das obrigações legais;
- Garantir que não tenha trabalho infantil na propriedade.
Produtivo – (Bem-estar animal):
- Bem-estar animal, conforme a Instrução Normativa nº 56/2008 (REBEM), assegurando manejo adequado, instalações apropriadas e transporte seguro dos animais.
- Controle de vacinação e sanidade, incluindo programas contra brucelose e tuberculose (IN nº 10/2017, PNCEBT), e demais vacinas exigidas.
- Registro e identificação dos animais, garantindo rastreabilidade, especialmente em propriedades com criação de bovinos e bubalinos conforme regulamentação nacional e estadual.
- Condições de manejo e infraestrutura, seguindo normas de higiene, alimentação, alojamento e transporte de animais, inclusive conforme legislação estadual e normas técnicas federais.