“O risco ambiental deixou de ser apenas uma questão reputacional para ser avaliado como um risco de crédito” - Produzindo Certo
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“O risco ambiental deixou de ser apenas uma questão reputacional para ser avaliado como um risco de crédito”

Uma cifra chama atenção e acende um alerta no agronegócio: ao menos R$ 20 bilhões em operações de crédito rural foram barrados pelo Banco Central nos últimos dois anos devido a irregularidades ambientais. A informação, publicada pelo AgFeed, demonstra que o risco ambiental deixou definitivamente de ser apenas um tema reputacional. Agora, ele pesa diretamente na análise de crédito, redefine o apetite de risco e pode até bloquear recursos fundamentais para a safra.

A decisão do BC não surge isolada. Ela reflete um movimento global de incorporação de critérios ESG em operações financeiras e reforça a necessidade de conformidade documental, geoespacial e jurídica por parte dos produtores. A tendência é que propriedades com pendências ambientais enfrentem mais restrições, enquanto propriedades socioambientalmente corretas ganham mais competitividade.

Nesse novo cenário, entender a relação entre risco ambiental e crédito passou a ser uma condição estratégica para quem produz. E é sobre esse ponto que Thiago Brasil, CFO da Produzindo Certo, ajuda a lançar luz.

Em entrevista ao Portal, ele explica que as instituições financeiras já não tratam irregularidades ambientais como um tema periférico. “O risco ambiental sempre foi visto como um tema reputacional ou de responsabilidade social. Recentemente passou a ser tratado também como um risco de crédito”, afirma.

Irregularidades ambientais, como desmatamentos, ausência de licenças e pendências no CAR (Cadastro Ambiental Rural) geram risco operacional e de mercado, como a perda de acesso a compradores estratégicos, além de potenciais multas, embargos e interdição. Na prática isso pode elevar a inadimplência e aumentar a perda esperada de operações de crédito.

“É uma decisão acertada do BC que força uma melhor precificação do risco de crédito, ou restrição a exposições que não atendem a requisitos mínimos. Em uma carteira agregada do setor, deveria representar uma elevação do custo de capital para ativos com problemas socioambientais, e uma melhora para os ativos regularizados”, disse Thiago Brasil.

CAR como peça central

Metade dos bloqueios registrados pelo Banco Central está relacionada ao Cadastro Ambiental Rural. O CAR, explica o CFO, se consolidou como a primeira camada de verificação em análises de crédito por reunir informações geoespaciais essenciais sobre áreas consolidadas, APP, reserva legal e possíveis passivos ambientais.

“As tecnologias de sensoriamento remoto e cruzamento de dados evoluíram e permitem a automatização de checagens iniciais. O CAR passou a ser um filtro, onde inconsistências detectadas levam a revisão ou bloqueio de operações”, destaca.

Além disso, imóveis com CAR atualizado e consistente tendem a apresentar menor risco de interrupções, maior liquidez no mercado e melhor avaliação como garantia para operações de crédito. A regularidade ambiental, portanto, não só destrava crédito como valoriza o patrimônio do produtor. “Um colateral que apresenta pendências, tem uma venda mais demorada e consequentemente está sujeito a um deságio grande para se tornar liquidez para um credor.”

Para quem está no campo, parte dos bloqueios poderia ser evitada com uma rotina mais rigorosa de gestão documental e ambiental. Entre as falhas mais comuns, Thiago Brasil aponta:

  • CAR desatualizado ou inconsistente, que pode levar ao bloqueio automático.
  • Falta de documentação de titularidade, como matrícula, contratos de arrendamento, ITR, CCIR ou procurações.
  • Pendências de licenças ambientais municipais ou estaduais.
  • Ausência de PRAD ou planos de recomposição, quando aplicáveis.

Ele reforça que os bancos já utilizam tecnologias para comparar versões do CAR ao longo do tempo e monitorar automaticamente qualquer alteração ocorrida durante a vigência do crédito. “O produtor precisa ter em mente que tecnologias atuais permitem avaliar e comparar de forma automática as alterações realizadas no CAR e monitorar mudanças ao longo do empréstimo.”

Medidas preventivas

Neste ponto, a Produzindo Certo tem atuado diretamente com diagnóstico, monitoramento e regularização socioambiental de propriedades rurais. Para Thiago Brasil, algumas ações são fundamentais antes de contratar crédito:

  1. Garantir a consistência do CAR, corrigindo polígonos, sobreposições e pendências.
  2. Monitorar continuamente a propriedade, evitando não conformidades que possam gerar embargos ou interrupções, e quando necessário realizar moderações.
  3. Manter transparência sobre eventuais passivos, apresentando PRAD, cronogramas e responsáveis técnicos.

“Ferramentas digitais como a Plataforma Produzindo Certo permitem o monitoramento remoto a um custo acessível. Isso traz celeridade na avaliação do crédito, no tratamento de passivos e reforça a transparência ao demonstrar boa gestão”, afirma.

O CFO reforça que problemas sempre existirão, mas precisam ser conhecidos, monitorados e acompanhados de um plano claro de execução. “A previsibilidade é essencial para operações de crédito e tem implicações diretas na precificação”.

O futuro do crédito rural

A tendência para os próximos anos é de aumento da participação do financiamento privado. Para se ter uma ideia, em abril de 2024, o saldo conjunto dos principais instrumentos de financiamento privado do agronegócio superou a marca de R$ 1 trilhão, 22% maior que o registrado no mesmo mês do ano anterior, segundo reportagem do Globo Rural.

Neste cenário, o compliance ambiental deve evoluir e ficar mais rigoroso, com potencial para induzir a uma maior segmentação do crédito, onde produtores regularizados e com maior adoção de boas práticas terão acesso a melhores condições de crédito (taxas e prazos), em função de uma melhor percepção do risco. Na outra ponta, quem não se adequar tende a enfrentar juros maiores, prazos mais curtos ou até barreiras de acesso.

Além disso, cresce o número de linhas verdes voltadas, por exemplo, para recomposição de pastagens, adoção de bioinsumos e redução de emissões. Um exemplo é o segundo Leilão Eco Invest Brasil, que vai destinar R$ 30 bilhões para restauração de áreas degradadas.

“Essas linhas oferecem condições vantajosas, mas exigem um robusto arcabouço de contrapartidas socioambientais, inclusive vinculadas a indicadores que sejam efetivamente verificáveis, muitas vezes no modelo loan-by-results”, explica Brasil.

Um novo ciclo

O movimento de integração entre dados socioambientais e instrumentos financeiros não se limita ao crédito. Ele já alcança o mercado de seguros, que começa a ajustar modelos de acordo com a adoção de boas práticas.

Um exemplo recente é a parceria entre a BrasilSeg e o Reg.IA, primeiro consórcio de agricultura regenerativa da América Latina, liderado pela Produzindo Certo, que busca adaptar seguros rurais à agricultura regenerativa.

Na prática, médios e grandes produtores que adotarem técnicas regenerativas validadas pelo Consórcio (rotação de culturas, cobertura vegetal, manejo adequado do solo e uso racional de insumos) poderão participar de um projeto piloto com condições de seguro a serem avaliadas de acordo com o menor nível de exposição a perdas.

“A capacidade de mensurar e dar transparência a essas iniciativas deve culminar em uma redução significativa dos prêmios de seguro existentes, visto o aumento da resiliência da produção e redução dos riscos associados”, pontua Thiago Brasil.

Com monitoramento mais sofisticado e maior rigor regulatório, o futuro do crédito rural será influenciado por dados ambientais, consistência documental e transparência. A tendência é de um mercado mais técnico, segmentado e orientado por resultados ambientais medidos.

Para os produtores, isso significa que regularização, monitoramento e boas práticas deixaram de ser apenas diferenciais. Agora, fazem parte do núcleo central da competitividade. E para quem já trilha esse caminho com apoio de plataformas especializadas, como a da Produzindo Certo, o cenário aponta para mais acesso, menos risco e melhores condições financeiras.