Produzir alimentos no mesmo solo por mais de 70 anos é um desafio que exige mais do que tradição: exige visão, responsabilidade e compromisso com o futuro. É exatamente essa a história que Maira Coscrato Lelis da Silva vem escrevendo à frente da Fazenda Santa Helena, em Guaíra, no interior de São Paulo.
Representante da terceira geração da família no comando da propriedade, ela transformou o negócio familiar em símbolo de inovação, regeneração ambiental e protagonismo feminino no agro brasileiro.
“Tudo começou com o meu avô, o meu pai, o meu irmão. Hoje, nós estamos na quarta geração com o meu filho dentro do negócio. Então, produzir alimentos há muitos anos no mesmo solo e ter um solo vivo, um solo saudável, é um desafio”, reforça Maira, em entrevista ao Portal do Produzindo Certo.
Com uma gestão voltada para práticas agrícolas sustentáveis, ela adotou a rotação de culturas, investiu na cobertura vegetal com mix de plantas e reduziu consideravelmente o uso de insumos químicos. As mudanças começaram a surtir efeito visível tanto no campo quanto nos indicadores da fazenda, que teve um salto de produtividade de mais de 50% nos últimos anos, sem ampliar a área de plantio.
“O produtor precisa entender que o nosso sistema produtivo está debaixo dos nossos pés, de algo que a gente não vê. A gente não tem que olhar a planta só na parte aérea. Primeira coisa, a gente precisa de ter um diagnóstico bem feito, saber realmente a necessidade do nosso solo”, defende a produtora.
Hoje, a Santa Helena colhe os frutos de um solo mais oxigenado, com maior presença de microrganismos e mais resiliência às intempéries. “Colocamos a semente em um ambiente preparado para ela crescer. É um solo descompactado, aerado, cheio de vida. Essa é a grande transformação que está em curso”, relata.
Certificação RTRS
O trabalho de Maira e da equipe da Santa Helena alcançou um importante marco em 2024, com a conquista da certificação RTRS (Round Table on Responsible Soy), que atesta a produção responsável de soja com critérios ambientais, sociais e de governança.
A conquista da certificação contou com o suporte técnico e socioambiental da Produzindo Certo, que foi essencial para estruturar e validar as boas práticas da fazenda. O processo foi viabilizado por meio da parceria com o Grupo CJ Selecta, reforçando o compromisso conjunto com uma produção mais responsável e alinhada aos padrões internacionais.
“Ser certificada RTRS, para mim em particular, faz parte de um sonho. É a gente ter reconhecimento pelas boas práticas já fazemos dentro da nossa fazenda”, diz ela.
“E é muito mais do que só uma certificação, é uma mudança de comportamento, porque hoje uma fazenda certificada, ela tem que ser sustentável no seu ambiente, no seu solo, na sua cadeia produtiva, mas ela também tem que ter um olhar para a sua governança, para o seu social”, completa.
Voz ativa no agro
Maira com o filho, Pérsio Augusto, e o irmão, José Eduardo
Maira Lelis é uma voz ativa e influente nas discussões sobre sustentabilidade no agronegócio. Embaixadora do programa PRO Carbono, da Bayer — que tem o objetivo de auxiliar produtores a alcançarem maiores níveis de sequestro de carbono a partir de práticas sustentáveis —, ela participa desde o início da iniciativa.
“Já foi desenvolvida pela Embrapa, junto com a Bayer, uma calculadora que já tem a nossa pegada de carbono dentro do nosso solo. E nós vamos saber que em solos produtivos a gente retém muito gás carbônico e vamos ser a maior fábrica de oxigênio do nosso planeta produzindo alimentos”, reforça.
A produtora também destaca protagonismo feminino cada vez mais expressivo no setor. “A mulher dentro do agro tem sido uma mudança muito constante, ela saiu do escritório, de ajudar na sucessão ou em atividades administrativas e começou a ir para o campo, começou a sujar a botina”.
Ela observa um movimento crescente de mulheres atuando em todos os elos da cadeia produtiva, se conectando e fortalecendo umas às outras. “Eu falo que nós mulheres somos mais detalhistas, mais cuidadosas, então eu sinto isso. É uma transformação e um engajamento muito forte que tem acontecido”.
Próximos passos
Para o futuro, a meta da Fazenda Santa Helena é seguir ampliando práticas sustentáveis e reduzir ainda mais a dependência de insumos químicos. O foco está na melhoria contínua da qualidade do solo, no fortalecimento da biodiversidade e no uso inteligente da tecnologia.
A visão é clara: produtividade e sustentabilidade não são caminhos opostos. Pelo contrário, se complementam. E a trajetória da Fazenda Santa Helena é prova disso.
“Os próximos passos são cada dia ser mais sustentável no nosso negócio, poder usar de todos os benefícios que a gente está tendo com a reciclagem de nutrientes do nosso solo, diminuir cada dia mais o uso de herbicidas, ter plantas mais fortes, mais resilientes, mais resistentes. Construir o ambiente com detalhes, saber o que a gente precisa melhorar em cada talhão através do diagnóstico, construir o caminho. A gente quer cada dia ser mais sustentável no nosso ambiente, no nosso negócio”, conclui.
As quatro gerações da Fazenda Santa Helena reunidas
