A percepção da sustentabilidade na moda - Produzindo Certo
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A percepção da sustentabilidade na moda

O que a indústria têxtil ganha com a sustentabilidade? Entre as várias respostas para essa pergunta estão o aumento de vendas, a retenção de colaboradores, a conquista de mais consumidores e a valorização da marca. Foi o que revelou estudo realizado por um grupo de pesquisadores da Universidade do Missouri, nos Estados Unidos, e publicado na revista Fashion and Textiles.

No entanto, para desfrutar desses resultados, além de garantir que toda a cadeia produtiva seja sustentável, é preciso eficiência em comunicar esse status, mostrar de forma clara e compreensível seus impactos socioambientais ou a responsabilidade social da corporação (CSR, do inglês Corporation’s Social Responsability).

Também vale ressaltar que esses não são resultados imediatos. Afinal, tanto a construção de uma cadeia produtiva sustentável, responsável, quanto a conquista do reconhecimento institucional da marca não acontecem da noite pro dia.

Ao final, a persistência é recompensada por ganhos mais sólidos e perenes. Uma das conclusões do estudo é que uma estratégia comercial focada na instantaneidade, visando exclusivamente ao lucro rápido, pode não ser tão benéfica quanto a escolha do que é duradouro, que tenha um propósito maior.

A pesquisa é baseada em entrevistas feitas com funcionários e clientes da H&M e da Nike, duas das marcas mais conhecidas nos Estados Unidos e mundialmente, e que já apareceram na lista das 100 empresas mais sustentáveis da Corporate Knigths, empresa canadense líder no segmento de mídia e pesquisa em economia sustentável.

Ao todo, o estudo realizado de forma on-line reuniu 865 respostas – da H&M foram 158 profissionais do varejo e 275 consumidores e da Nike, 157 profissionais do varejo e 275 consumidores.

Por mais representativos que esses números possam ser, é importante considerar que envolveu apenas duas marcas. Dessa forma, trata-se de uma amostragem relevante, que serve de referência, mas não deve ser tomada como verdade absoluta do setor. Por outro lado, abre a possibilidade de outros levantamentos que enriqueçam os dados disponíveis.

Benefícios da veracidade

De acordo com Jung Ha-Brookshire, presidente do Departamento de Têxteis e Vestuários da Universidade do Missouri, e sua equipe, companhias bem-sucedidas vêm lutando para conscientizar seus clientes sobre sua postura sustentável. “Em nossa investigação, os consumidores não tendiam a acreditar que a empresa fazia o suficiente para ajudar a sociedade”, afirmou o pesquisador.

A compreensão é bem diferente por parte dos colaboradores, que reconhecem o impacto social da companhia. “Eles se mostraram bem mais satisfeitos com o cumprimento das responsabilidades sociais pelas empresas”, disse Ha-Brookshire.

Tal cenário pode encorajar essas indústrias a trabalharem melhor a apresentação de seu impacto na sociedade para os potenciais consumidores. Para o pesquisador, isso significa que há uma grande oportunidade para que essas companhias aprimorarem sua comunicação, afinando cada vez mais a sintonia entre a realidade de suas iniciativas de responsabilidade social e a impressão que transmitem desse quadro.

Os benefícios passam ainda pela manutenção de colaboradores, e até pelo aprimoramento de sua eficácia. Esse desempenho pode variar conforme o respeito que os trabalhadores têm pelo empregador. A combinação desses fatores influencia a saúde financeira das empresas.

“A rotatividade de funcionários gera uma grande despesa. Custa contratar e demitir alguém”, comentou Ha-Brookshire. “Quando os colaboradores acreditam no que a empresa está dizendo e fazendo, seu comportamento melhora muito, o que gera economia para a companhia.”

Comunicação desde a base

Um dos pontos cruciais para que a indústria têxtil e da moda comunique adequadamente a seus consumidores o impacto socioambiental de seus produtos é ter a certeza desse comprometimento ao longo da cadeia. Entra nessa linha de raciocínio a criação do projeto piloto de créditos de couro sustentável, parceria entre a Produzindo Certo e a Textile Exchange, organização global sem fins lucrativos que ajuda a indústria da moda, têxtil e de vestuário a se conectar com os recursos que utiliza.

A iniciativa faz parte do programa Leather Impact Accelerator (LIA) da Textile Exchange e tem como objetivo remunerar o produtor pelo couro, combater o desmatamento e incentivar a adoção de boas práticas de bem-estar animal. O primeiro grupo a participar do programa, formado por quatro propriedades localizadas nos biomas Amazônia e Cerrado, gerou quase 100 mil créditos de couro sustentável, entre 2022 e 2023. “Já foi tudo comercializado”, afirma Charton Locks, COO da Produzindo Certo. A H&M foi uma das empresas que apoiaram a iniciativa.

A expectativa com o segundo grupo, que envolve sete propriedades e agrega também a Mata Atlântica, é de chegar a 80 mil créditos. Dessa forma, a média anual aumentaria para algo próximo de 130 mil créditos. Segundo Charton, essa é uma forma de conectar os pecuaristas com a indústria da moda. “E fazer com que os produtores engajados nessa jornada sejam mais bem valorizados no mercado”, comentou o executivo.

Os resultados já alcançados com esse projeto de créditos de couro sustentável, baseado na pecuária nacional, são uma importante contribuição para fortalecer a comunicação do setor têxtil, como mostrou a pesquisa da Universidade do Missouri. Sobretudo em relação à sustentação da imagem do segmento, pois grandes marcas mundiais estão cada vez mais próximas dessa realidade.

Do Brasil para o mundo

Como já mostramos por aqui, a Produzindo Certo e a Textile Exchange promoveram inclusive uma oportunidade para representantes de companhias globais da moda conferirem como é produção sustentável desde a base. A Tour do Couro Sustentável passou por Mato Grosso, em abril deste ano, reuniu cerca de 30 pessoas, a maior parte de estrangeiros, para visitarem propriedades e uma unidade industrial (frigorífico e curtume). “As fazendas visitadas integram a Plataforma Produzindo Certo, portanto já existe um histórico de sustentabilidade”, disse Charton.

Essa conexão tem via de mão dupla, pois Charton também atravessou o Oceano Atlântico para, entre outras missões, divulgar a produção de couro sustentável na Europa. Em outubro deste ano, o executivo foi a Londres, na Inglaterra, para participar da Textile Exchange Conference, evento anual da organização.

Enquanto as indústrias da moda descobrem que precisam se comunicar melhor com seus consumidores, a Produzindo Certo vem trabalhando para garantir essa condição à toda a cadeia agropecuária, apresentando ao mundo quão responsável e sustentável é o agronegócio brasileiro. Para isso, é preciso ter dados seguros e consistentes, ações concretas, transparência, clareza no diálogo e – por que não dizer? – uma certa dose de jogo de cintura.